Roubará o homem a Deus?

|

Qual cristão não conhece as palavras acima não é? Durante alguns anos de minha infância o versículo que traz esta frase foi um dos que eu mais escutava durante os cultos de uma certa denominação que frequentei quando criança. É claro que ele vinha acompanhado com a promessa da benção como vemos nos versículos seguintes
"Trazei todos os dízimos a casa do tesouro, para que nela haja mantimento, e provai-me nisto, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrir as janelas dos céus e derramar bênçãos sem medidas".

Eu não sou muito bom para decorar versículos. Costumo ter os textos em minha cabeça por inteiro, pois é a forma que os visualizo. Então, para mim é algo maravilhoso decorar três versículos, pois acreditem, transcrevi esses três versículos, do terceiro capítulo do livro do profeta Malaquias, de cabeça! Mas ao mesmo tempo em que é maravilhoso se torna nauseante imaginar que praticamente o único texto que decorei, é um dos textos que supostamente apóiam a idéia de que o dízimo possui uma obrigatoriedade legal para Deus, e que nos permite barganhar com o Altíssimo.

Passaremos então a discutir sobre um dos grandes ídolos do cristianismo. O dízimo! As questões abaixo serão respondidas em 4 postagens, de forma que possamos ter uma melhor compreensão sobre o dízimo em relação as doutrinas cristãs.

Qual a primeira ocorrência do dízimo na bíblia?
Quando o dízimo passou a ser obrigatório?
Como era o dízimo? Para que era utilizado?
Quem estava autorizado a recebê-lo?
É o dízimo uma obrigatoriedade ao cristão?
Como o cristianismo deve encarar o dízimo?
Após termos todas estas perguntas respondidas, poderemos fazer uma interpretação muito mais sincera de Malaquias 3:8-10. Comecemos então.

Qual a primeira ocorrência do dízimo na bíblia?
Encontramos a primeira referência bíblica sobre o dízimo em Genesis 14:18-20:

“Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; era sacerdote do Deus Altíssimo; abençoou ele a Abrão e disse: Bendito seja Abrão pelo Deus Altíssimo, que possui os céus e a terra; e bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus adversários nas tuas mãos. E de tudo lhe deu Abrão o dízimo.”

O contexto precedente deste texto se trata de uma batalha histórica entre 8 grandes reinos, tendo sido os mesmos divididos em 2 grupos de quatro reis: Anrafel, rei de Sinar, Arioque, rei de Elasar, Quedorlaomer, rei de Elão, e Tidal, rei de Goim batalharam contra Bera, rei de Sodoma, Birsa, rei de Gomorra, Sinabe, rei de Admá, Semeber, rei de Zeboim, e contra o rei de Bela. Como veremos nos versículos de 12 a 14, Ló o sobrinho de Abraão foi feito prisioneiro de guerra, sendo esse o motivo que levou Abraão a participar do combate.

“Apossaram-se também de Ló, filho do irmão de Abrão, que morava em Sodoma, e dos seus bens e partiram. Porém veio um, que escapara, e o contou a Abrão, o hebreu; este habitava junto dos carvalhais de Manre, o amorreu, irmão de Escol e de Aner, os quais eram aliados de Abrão. Ouvindo Abrão que seu sobrinho estava preso, fez sair trezentos e dezoito homens dos mais capazes, nascidos em sua casa, e os perseguiu até Dã.”

Abraão então consegue resgatar Ló e seus bens, e retorna:

“E, repartidos contra eles de noite, ele e os seus homens, feriu-os e os perseguiu até Hobá, que fica à esquerda de Damasco. Trouxe de novo todos os bens, e também a Ló, seu sobrinho, os bens dele, e ainda as mulheres, e o povo. Após voltar Abrão de ferir a Quedorlaomer e aos reis que estavam com ele, saiu-lhe ao encontro o rei de Sodoma no vale de Savé, que é o vale do Rei” 15-17

Chegamos então ao texto no qual Abraão dá o dízimo de tudo a Melquisedeque. Pelo contexto que precedeu os versículos 18-20 claramente entendemos que o dízimo de tudo, dado por Abraão, se referia aos despojos de guerra. Abraão deu o dízimo do que foi conquistado na guerra, não segundo uma ordem divina, e sim segundo a tradição cultural da região em que vivia. Podemos entender melhor isso pelos versículo seguintes:

“Então, disse o rei de Sodoma a Abrão: Dá-me as pessoas, e os bens ficarão contigo. Mas Abrão lhe respondeu: Levanto a mão ao SENHOR, o Deus Altíssimo, o que possui os céus e a terra, e juro que nada tomarei de tudo o que te pertence, nem um fio, nem uma correia de sandália, para que não digas: Eu enriqueci a Abrão;” 21-23
O Ph.D. Russell Earl Kelly, em seu livro “Tem a Igreja a Obrigação de Ensinar a Dizimar?”, esclarece que o versículo 21 trata-se de uma tradição Árabe pagã, na qual os despojos de guerra, deveriam ser repartidos ficando as pessoas conquistadas com o Rei, e os bens conquistados com aquele que os conquistara. Abraão não querendo ficar com nada que fora conquistado na guerra, dá então os 90% que sobraram dos despojos da guerra para o rei de Sodoma.
Do exemplo de Abraão então, nada podemos tirar, pois vemos que o mesmo apenas estava seguindo a tradições culturais de sua época, e não cumprindo mandamentos de Deus. Do contrário teríamos que pensar que, se Abraão dizimou segundo ordem divina, então devemos dar 10% para Deus e os outros 90% para algum rei pagão!
A outra referência sobre o dízimo que encontraremos antes da lei, é com relação ao voto feito por Jacó:
“Fez também Jacó um voto, dizendo: Se Deus for comigo, e me guardar nesta jornada que empreendo, e me der pão para comer e roupa que me vista, de maneira que eu volte em paz para a casa de meu pai, então, o SENHOR será o meu Deus; e a pedra, que erigi por coluna, será a Casa de Deus; e, de tudo quanto me concederes, certamente eu te darei o dízimo.” Genesis 28:20-22
Jacó está aqui, de livre vontade, fazendo um voto com Deus. Sem lei, sem obrigação, sem tradição. Apenas clamando a provisão divina, e prometendo ser fiel, retribuindo a Deus caso o mesmo o abençoe.
São essas então as duas primeiras e únicas referências ao dízimo antes da Lei. Por elas podemos constatar que o dízimo não era uma obrigatoriedade. Foram dois casos esporádicos, sendo 1 por tradição regional, e o outro como um voto particular feito com Deus.
No próximo texto veremos quando o dízimo passou a ser obrigatório para o povo de Israel, como ele era e para que era utilizado!

Anderson L. Santos Costa

0 comentários:

 

©2009 Fazendo Theóslogia | Template Blue by TNB